A Epidemiologia no enfrentamento da pandemia de coronavírus - parte 10
Por Professora Ethel Leonor Noia Maciel*
Fui convocado(a) ao trabalho. E agora?
Essa é a pergunta que mais tenho respondido no último mês. A insegurança trazida pela pandemia de um novo vírus e a constatação de muitas mortes foram motivo de angústia e sofrimento por parte de muitos trabalhadores.
Essa angústia é real e deve ser encarada com a seriedade que o momento exige. Para este retorno, as Instituições devem se preocupar com a Avaliação de Riscos e a criação de planos de Biossegurança a fim de garantir a segurança e o bem estar de todos no trabalho presencial.
Risco, em Epidemiologia, é a probabilidade de ocorrência de um resultado desfavorável, de um dano ou de um fenômeno indesejado. Desta forma estima-se o risco ou probabilidade de que uma doença exista através dos coeficientes de incidência e prevalência. Para a Organização Mundial de Saúde, o fator de risco de um dano são “todas as características ou circunstâncias que acompanham um aumento de probabilidade de ocorrência do fato indesejado sem que o fator tenha intervindo necessariamente em sua causalidade”.
Estabelecer protocolos básicos e recomendações para prevenir e controlar a disseminação do vírus SARS-CoV-2 nos ambientes de trabalho, por meio de ações de organização, prevenção e controle de infecção, estabelecendo diretrizes, normas e orientações relacionadas ao seu enfrentamento, é condição para minimizar o risco de infecção.
As medidas que visem garantir a rotina segura de procedimentos e atividades durante a pandemia da COVID-19, bem como para orientar a manutenção de um ambiente institucional seguro e saudável no contexto da epidemia da COVID-19, e quando não for possível, sugerir formas alternativas para o seu cumprimento em modalidades não presenciais, enquanto estivermos em um ambiente sem vacina eficaz.
O plano de Biossegurança deve levar em conta os níveis de risco associados aos diferentes locais de trabalho e às tarefas que os trabalhadores executam nestes locais, além do meio de locomoção que utilizam para o transporte até o trabalho.
Essas considerações devem incluir a proteção dos indivíduos particularmente com alto risco de infecção e desenvolvimento de doenças mais graves (idosos, pessoas com doenças crônicas incluindo pessoas imunocomprometidas, obesos, tabagistas e grávidas, dentre outros) e controles necessários direcionados a esses riscos.
Para minimizar, os riscos da COVID-19 estabelecidos na literatura são hierarquizados e precisam ser avaliados para cada setor. O mais importante na hierarquia do risco é o distanciamento físico, seguido pelos controles de engenharia, as medidas administrativas e, por fim, os equipamentos de proteção individual. Em linhas gerais podemos elencar:
Distanciamento Físico – o distanciamento físico ideal entre os trabalhadores é de 2,0 metros. As mesas e salas devem ser medidas de forma a garantir essa distância. A avaliação de risco é em relação ao contato; sua intensidade e o número de contatos, e o quanto as atividades poderão ser modificadas através de medidas de mitigação que possibilitem que os trabalhadores fiquem a 2 metros de distância um do outro para reduzir o risco de transmissão. Para a avaliação de risco, a intensidade do contato pode ser considerada próxima ou distante e a duração do contato, rápido ou prolongado. O número de contatos pode ser considerado baixo, médio e alto. A definição do número de contatos deve levar em conta o número de pessoas no mesmo local de trabalho ao mesmo tempo.
Controles de Engenharia – Diz respeito à criação de barreiras físicas entre as pessoas quando necessário, como colocação de divisórias, separação com barreira de vidro quando há atendimento ao público e reconfiguração do espaço para permitir o distanciamento físico. Também é importante a observação do fluxo de ar, para o reposicionamento de móveis. As janelas e portas devem permanecer abertas a depender do fluxo de ar no local.
Controles Administrativos – redistribuição de responsabilidades para reduzir o contato entre os indivíduos, utilizando a tecnologia para facilitar a comunicação, apoiar e permitir que os funcionários permaneçam em casa, caso não estejam se sentindo bem ou tenham entrado em contato com algum suspeito de doença. Os controles administrativos dizem respeito a todos os fluxos criados para entrada, saída, alimentação, alternância de horários e dias, objetivando reduzir o número de pessoas e também os protocolos de limpeza e desinfecção, com responsabilidades definidas para cada passo de quem limpa, como e com qual material. A criação de Procedimentos Operacionais Padrão (POP) deve definir de forma inequívoca as reponsabilidades e o plano de ação em cada evento que ocorrer no local. Treinamentos periódicos devem garantir também que todos entendem seu papel no novo ambiente de trabalho.
Equipamentos de Proteção Individual (EPI) – utilização de máscaras caseiras durante o percurso até o trabalho, sua troca no início do turno e sua utilização durante todo o período de trabalho e, em casos especiais de atendimento ao público, anteparo facial. Local adequado para a lavagem das mãos no início do turno e toda vez que for necessário é fundamental para a manutenção de um ambiente seguro.
Portanto, há que se considerar que o retorno às atividades presenciais não será o mesmo. Os protocolos de biossegurança devem garantir também, fluxos de testagem de pessoas suspeitas de acordo com o nível de risco definido. Cada instituição deverá informar aos seus trabalhadores de que forma essa testagem será feita, em qual local e os fluxos a serem seguidos, inclusive para o isolamento. Nessa fase de retorno, a disponibilidade de testes diagnósticos se faz fundamental para que avaliações de surtos da doença sejam rapidamente identificadas e que o menor número de pessoas seja atingido.
Sem uma vacina, é importante que se compreenda que ainda há um vírus novo que circula entre nós, que causou e poderá causar ainda muitas mortes, e portanto, a garantia do cuidado e a adesão às normas de biossegurança são fundamentais para que possamos desempenhar as funções laborais em ambientes os mais seguros possíveis. Importante ainda salientar que não há ambiente livre de riscos. Há normas de biossegurança que podem garantir a minimização desses riscos e, portanto, o seu estrito seguimento é a garantia de um ambiente seguro para todos.
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*Professora Ethel Leonor Noia Maciel é epidemiologista em doenças infecciosas do Departamento de Enfermagem da Ufes. É uma das responsáveis pelo Laboratório de Epidemiologia do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Ufes.
Foto: Freepik
Publicado em 10 de agosto de 2020.